domingo, 10 de junho de 2012

Balzac: contemporâneo ao extremo




Balzac não ficou apenas preso em sua época, quando desvendou com inteligência as artimanhas de uma imprensa que poderia lançar flechas por todos os lados. Na contemporaneidade, a impressão que fica é de que o escritor de "Ilusões Perdidas" ainda vive nas atitudes daqueles que praticam o ofício de reportar a realidade.

Na faculdade fui instigado por força de uma avaliação a ler ‘Ilusões Perdidas’ para, em seguida, transformar 365 páginas em um sucinto artigo. Não consegui. Li o livro de Balzac tempos depois, sem pretensão e por vontade própria para entender o porquê de tanta devoção ao romancista.

Em ‘Ilusões Perdidas’, os fatos são narrados de uma forma densa e rica em detalhes que chegam a cansar qualquer leitor que se preze. Mas vale a pena persistir página a página. Tantos detalhes, marcas e situações vão surgindo ao longo do livro e são, de fato, os primeiros passos para a elucidação do clímax.

Pois bem! Vamos dissecar 'Ilusões Perdidas'. Em toda a primeira parte, batizada de "Dois poetas", Balzac descreve a vida na pacata cidade francesa Angoulême, colocando suas impressões na vida de um sonhador chamado Luciano que almeja fazer sucesso em Paris como poeta; de seu melhor amigo, David Séchard, que passa a comandar a ultrapassada tipografia de seu pai, de Ève, irmã de Luciano, por quem David se apaixona; e o núcleo aristocrático comandado pela senhora de Bargeton, que será amante de Luciano e, como ele, sonha com os esplendores da capital.

Luciano não consegue se dar bem na poesia e acaba no jornalismo. Nessa transição que Balzac destila suas maiores críticas: a de que os jornalistas são vendedores de opinião, e avessos da ética. Dessa constatação, o escritor expõe a inferioridade do jornalismo em relação à literatura quando defende que para se fazer um livro é necessário colocar a alma nas palavras, mas, para escrever um artigo só basta uma boa quantia em dinheiro, uma vez que o destino de um artigo jornalístico é, segundo Balzac, o mar do esquecimento.

Esta visão fica clara nas atitudes de Vernou, um dos personagens que dão voz aos jornalistas na obra. Como nessa passagem: “O senhor então assume tudo o que escreve? – disse-lhe Vernou, brincalhão. Acontece que somos negociantes de frases, vivemos de nosso comércio. Quando quiser fazer uma grande bela obra, um livro, enfim, poderá nele lançar os seus pensamentos, sua alma, entregar-se a ele; mas artigos lidos hoje, esquecidos amanhã, a meus olhos, só valem o que se paga por eles”.

Mas a visão de Balzac a respeito dos jornalistas é um tanto ácida, generalista e preconceituosa. Isso porque o escritor coloca todos os profissionais em um mesmo bojo. Para o escritor, aqueles que adentram na lida diária do jornalismo encontram lugar fácil para se corromper ou ainda, todo profissional da área já não utiliza da ética nas práticas sociais quando lida com o jornalismo. Que bom que as exceções existem!

Mas o que torna a leitura de Balzac contemporânea é a espontaneidade com que o escritor trata a temática da ética no jornalismo, fundamental para a profissão que se propõe a instigar a sociedade em prol de mudanças. Muito diferente da poesia, que se nutre de uma realidade ficcional, o jornalismo se pauta no real, nos acontecimentos do dia. Nada melhor do que a ética para nortear qualquer trabalho jornalístico.

Balzac inova e sobressai ao enfocar esta temática. O livro é fundamental para estudantes e profissionais da área. Nunca é demais martelar quem sem ética, jornalismo, de verdade, passa longe.

Boa leitura!

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