Balzac
não ficou apenas preso em sua época, quando desvendou com inteligência as
artimanhas de uma imprensa que poderia lançar flechas por todos os lados. Na
contemporaneidade, a impressão que fica é de que o escritor de "Ilusões
Perdidas" ainda vive nas atitudes daqueles que praticam o ofício de
reportar a realidade.
Na
faculdade fui instigado por força de uma avaliação a ler ‘Ilusões Perdidas’
para, em seguida, transformar 365 páginas em um sucinto artigo. Não consegui.
Li o livro de Balzac tempos depois, sem pretensão e por vontade própria para
entender o porquê de tanta devoção ao romancista.
Em
‘Ilusões Perdidas’, os fatos são narrados de uma forma densa e rica em detalhes
que chegam a cansar qualquer leitor que se preze. Mas vale a pena persistir
página a página. Tantos detalhes, marcas e situações vão surgindo ao longo do
livro e são, de fato, os primeiros passos para a elucidação do clímax.
Pois
bem! Vamos dissecar 'Ilusões Perdidas'. Em toda a primeira parte, batizada de
"Dois poetas", Balzac descreve a vida na pacata cidade francesa
Angoulême, colocando suas impressões na vida de um sonhador chamado Luciano que
almeja fazer sucesso em Paris como poeta; de seu melhor amigo, David Séchard,
que passa a comandar a ultrapassada tipografia de seu pai, de Ève, irmã de
Luciano, por quem David se apaixona; e o núcleo aristocrático comandado pela
senhora de Bargeton, que será amante de Luciano e, como ele, sonha com os
esplendores da capital.
Luciano
não consegue se dar bem na poesia e acaba no jornalismo. Nessa transição que
Balzac destila suas maiores críticas: a de que os jornalistas são vendedores de
opinião, e avessos da ética. Dessa constatação, o escritor expõe a
inferioridade do jornalismo em relação à literatura quando defende que para se
fazer um livro é necessário colocar a alma nas palavras, mas, para escrever um
artigo só basta uma boa quantia em dinheiro, uma vez que o destino de um artigo
jornalístico é, segundo Balzac, o mar do esquecimento.
Esta
visão fica clara nas atitudes de Vernou, um dos personagens que dão voz aos
jornalistas na obra. Como nessa passagem: “O senhor então assume tudo o que escreve? –
disse-lhe Vernou, brincalhão. Acontece que somos negociantes de frases, vivemos
de nosso comércio. Quando quiser fazer uma grande bela obra, um livro, enfim,
poderá nele lançar os seus pensamentos, sua alma, entregar-se a ele; mas
artigos lidos hoje, esquecidos amanhã, a meus olhos, só valem o que se paga por
eles”.
Mas
a visão de Balzac a respeito dos jornalistas é um tanto ácida, generalista e
preconceituosa. Isso porque o escritor coloca todos os profissionais em um
mesmo bojo. Para o escritor, aqueles que adentram na lida diária do jornalismo
encontram lugar fácil para se corromper ou ainda, todo profissional da área já
não utiliza da ética nas práticas sociais quando lida com o jornalismo. Que bom
que as exceções existem!
Mas
o que torna a leitura de Balzac contemporânea é a espontaneidade com que o
escritor trata a temática da ética no jornalismo, fundamental para a profissão
que se propõe a instigar a sociedade em prol de mudanças. Muito diferente da
poesia, que se nutre de uma realidade ficcional, o jornalismo se pauta no real,
nos acontecimentos do dia. Nada melhor do que a ética para nortear qualquer
trabalho jornalístico.
Balzac
inova e sobressai ao enfocar esta temática. O livro é fundamental para
estudantes e profissionais da área. Nunca é demais martelar quem sem ética,
jornalismo, de verdade, passa longe.
Boa
leitura!
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