As onomatopeias tomaram
conta do catálogo da música brasileira. Não adianta tapar os ouvidos porque
todas as músicas vêm com um item de fábrica infalível: os refrões-chiclete que são de
cortar os pulsos. O cancioneiro popularesco é amplo, mas cito refrões de duas
canções de maior sucesso no momento. É espantosa a inventividade presente nas
letras: “Eu quero tchu, eu quero tcha” e “Ai ai ai, assim você mata o papai” e
por aí vai.
Todas elas no top 10 das
músicas mais tocadas em rádios país afora - esse estilo musical – reverbera um
fenômeno social recente que é a ascensão da classe C no país. Além de
eletrônicos, casas, carros, a nova classe C também é famigerada por música,
dita, popular. E quanto mais no interior você estiver, mais latente é o
fenômeno.
Recentemente fiz uma viagem
até a divisa de Mato Grosso com o Pará, mais precisamente, à cidade de Guarantã
do Norte. No trajeto, esgotei o repertório das músicas contidas no meu pendrive
e decidi - conjuntamente com a minha irmã e cunhado - ouvir rádio. Foi uma tristeza! Perdi as contas de quantos tchus e
tchás ouvi. Ah, não posso esquecer do fenômeno mundial da música brasileira
encarnada por Teló. O “Nossa, nossa, assim você me mata” ainda não foi
engavetado.
Mas será que a classe C já
ouviu falar em Lenine, Elis Regina, Cartola, Gonzaguinha, Nara Leão, Tom Jobim
e Vinícius de Moraes? Ela não é tão burra assim para querer só as onomatopeias.
Talvez o que ainda falta é o primeiro contato com artistas de verdade que
desestruturam a gente por completo em apenas um acorde.
Lembro-me claramente do
primeiro contato que tive com o repertório da Elis. Era moleque, tinha 12 anos.
Naquela época já ouvia Legião Urbana, Cazuza, Titãs. Fiquei hipnotizado com a
voz e a interpretação da Pimentinha. Depois de Elis, fui correndo ao trabalho
do Chico Buarque, Milton Nascimento. Fui salvo das onomatopeias. Mas antes do
primeiro contato, confesso que, por total ignorância, achava o trabalho desses monstros
da música popular brasileira uma idiotice. Ufa!
Mas como jornalista, não dá
para tapar os ouvidos e fingir que nada está acontecendo. Se o fenômeno está
ali na sua cara, o seu dever é o de simplesmente registrá-lo e, ao final,
procurar respostas para tanta adesão. O problema é que a imprensa também
massifica e coloca muito fermento na massa, quando não deveria.
E não há
limites para o pior. A tendência é a consolidação desse tipo de repertório nos
próximos anos. A saída será o consumo de músicas do circuito 'underground'
lançadas por artistas seletos para públicos mais seletos ainda.
Se estivesse por aqui o trio
Elis, Tom e Vinícius daria risada do cenário musical vigente que não se
sustenta e, tampouco, emociona. Uma pena!