O exercício da gentileza é um sacerdócio para alguns e penitência para outros. Confesso que não é nada fácil ser gentil em
uma sociedade como aí está. Agradeça quando alguém lhe disser: ‘por favor e
muito obrigado’. Pule de alegria se ouvir: ‘por gentileza’. Este último está
cada vez mais escasso das relações sociais.
Uma das minhas tarefas diárias é conversar com
muita gente pelo telefone. É daí que muitas pautas surgem. Se a grande parcela
das pessoas liga para dar sugestões, outra parte da fatia está do outro lado da
linha em busca de informação.
E nessa hora é preciso ter jogo de cintura. Ainda
mais em meio à pauta que não vira, à pressão típica de uma redação, reuniões e
tantas obrigações, às vezes, esclarecer dúvidas por telefone não é uma tarefa nada
fácil. Exige paciência! Mas é incrível como a reação das pessoas muda quando o
diálogo se estabelece e todas as atenções são devotas a ela.
Muita gente ainda não confia na internet ou não se
familiarizou com o meio. E por isso ainda usa o telefone para se informar. São
pessoas de um tempo em que a confiança se materializava nas palavras. Que bom
que essa geração ainda está por aí.
Não sou o mais gentil dos homens e nem o mais bruto
deles. Respeito para ter o direito de ser respeitado. E assim ao final
de toda uma dezena de ligações aprendi a dizer: ‘te agradeço’. Às vezes passo
uma raiva danada com a pessoa do outro lado da linha, mas o ‘te agradeço’ não
falta. E isso já me salvou.
Certa vez fui muito mal tratado por uma assessora
de imprensa. Estava à procura de dados para uma reportagem. Ela desconversou e
gritou comigo. E sem eu querer saiu o ‘te agradeço’. Jamais queria ter dito
aquilo, ainda mais, naquela situação.
Minutos depois, desconcertada e com voz aveludada,
a assessora retornou a ligação com todos os dados que tanto eu precisava. Eis o
poder da gentileza que abre todas as portas.
Uma figura que não mais está entre nós pregou
por onde andou o seguinte lema: ‘Gentileza gera Gentileza’. De traços
messiânicos, cabelos compridos e corpo esguio, José Datrino se transformou no
Profeta Gentileza. Ficou famoso por desenhos peculiares e palavras conclamando
o respeito a todos nos viadutos do Rio de Janeiro. Chegou a ser enredo de
escola de Samba.
Li uma crônica,
recentemente, sobre ele e fiquei fascinado com tamanho desprendimento. O
profeta Gentileza largou tudo para propagar o respeito. Quem conviveu com o
profeta diz que só uma coisa tirava José Datrino do sério: as roupas curtas das
mulheres. Se ele fosse à praça Popular em Cuiabá teria um ataque. Melhor não!
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